Fotos: Janaína Costa - Recid Pará

Sonhos e vivências junto ao povo da região Transamazônica- Oeste do Pará

Fotos: Janaína Costa - Recid Pará

Partilhar a vivência de três dias (25 a 27 de novembro), junto à população da região da Transamazônica é uma alegria. Retornar a esse chão acolhedor, é uma experiência nova. Estivemos contribuindo no I seminário dos trabalhadores/as em Educação do município de Placas, promovido pelo sindicato dos trabalhadores/as em educação pública do Pará – SINTEPP – Subsede de Placas.

 

Foi significativo encontrarmos um público de quase 500 pessoas ligadas à educação (professores urbanos e das comunidades rurais, gestores, coordenadores, merendeiras, porteiros), dos municípios de Placas, Ruropolis, Itaituba, Santarém e como convidado, o sindicato dos/as trabalhadores/as rurais, além do secretário municipal de educação de Placas e representantes do sindicato dos trabalhadores/as da educação de Santarém.

O seminário possibilitou a reflexão em torno da formação sindical, gestão compartilhada, qualidade do ensino, desafios e perspectivas para a educação na região, direitos trabalhistas e uma oficina sobre Participação e controle social, mediada pela educadora Janaina Costa – Rede de Educação Cidadã/PA. Também estivemos em reunião com a associação das mulheres artesãs de Placas que conta com 36 mulheres associadas. Nesta reunião buscamos ver como podemos contribuir na busca de captar recursos, via projetos para construção de um espaço físico para sede da associação e claro, pensar na formação políticas das mulheres via Rede de Educação Cidadã.

Chegamos à Altamira, maior município em extensão geográfica da América Latina e o 2º. maior do mundo por volta das 22h30, depois de um pouso que nos assustou, coisas de quem anda pela Amazônia. Fomos recebidos pelo casal Adilar e Juliana Locattelli, seguindo imediatamente para Placas, isso por volta das 23h. Seguimos, experimentando e aventurando a Br. 163, contando piadas, histórias, enfrentando a escuridão e alertando Locattelli, pois aqui, não podemos cochilar. Por volta das 03h chegamos a Placas, e já às 9h nosso compromisso seria com a abertura do seminário. Nunca pensei que um dia experimentaria essa aventura, andar pela Transamazônica numa madrugada.

Placas – a 240 km da cidade de Altamira, tem esse nome por conta de que ainda nos anos 70, a Transamazônica, demarcada por trechos e nestes eram fixados placas, com nome de quem fez a demarcação, trecho e data. Por conta disso, esse trecho que deu origem ao município, recebeu o nome de Placas, segundo o prof. Lisvaldo Cesar – educador e historiador de Placas, um carioca que há anos fez opção de viver nesse pedaço da Transamazônica. O município tem uma população de quase 25.000 habitantes, desses por volta de 80% está na zona rural. Placas, como diversos municípios do país, sofre por falta de políticas públicas, que clama por segurança pública, por conselhos autônomos, por espaços de lazer para população, hospital, creche, escolas de qualidade. Seus problemas também perpassam por índice elevado de exploração e abuso sexual de crianças, drogas, famílias desagregadas onde a mulher é o chefe de família, falta de projetos sociais que ocupem a juventude. Estão vivenciando a conjuntura da eleição no dia 11 de dezembro para criação do estado do Tapajós. Esperam pelo sim e pela perspectiva de que essa divisão trará melhoria de vida para o povo, esperam sair do esquecimento, pois sabem que merecem o que o país ignorou ao longo desses anos de abandono.

O seminário começa no dia 25 – sexta feira com mesa de abertura, seguida de análise de conjuntura, onde fomos contribuir ressaltando a importância do momento, chamada pelo que o mundo e a América Latina vivência, povo indo à rua, da mobilização em torno de derrubada de governos ditatoriais, das campanhas contra a corrupção, mas também da conjuntura em que a região vive por conta da construção do Belo Monte, do quanto é importante que a população se aproprie das condicionantes do projeto e dos benefícios que devem gerar a população da Transamazônica.

O dia também foi dedicado a reflexão em torno da formação sindical, da gestão democrática, olhando para seus desafios e perspectivas. Mediamos na busca de inquietar quase 500 pessoas todos do campo da educação (professores, coordenadores pedagógicos, gestores, conselheiros, enfim, pessoas que fazem parte da comunidade educativa). Começamos fazendo um cochicho em torno de questões como: o que nos motiva a estarmos aqui?O que queremos levar desta experiência? Qual a situação da educação nos municípios participantes do seminário? Como mudar essa realidade?

A reflexão perpassou por um recorte histórico a partir dos anos 60, destacando o momento de ascensão dos sindicatos, dos movimentos sociais, da força do trabalho de base e da educação popular que teve papel importante na construção histórica do país, da política neoliberal que ganhou força nos anos 90, onde os serviços como saúde, educação eram vistos como mercadoria. Os desafios postos a educação para o século XXI e como a temática ambiental pode fazer parte da educação cotidiana, dos valores que devem nortear a educação e de como a educação popular enquanto pedagogia pode contribuir para se construir outro modelo de sociedade para a região.

Também apresentarmos a Rede de Educação Cidadã, fazendo uso do vídeo, pé dentro, pé fora, na construção do poder popular, pois a perspectiva para 2012, é ampliar a ação da Recid chegando à essa região do Tapajós.

No dia 26 – realizamos oficina com a temática: Participação e Controle Social – o papel do conselheiro – missão dos conselhos – o momento foi mediado pela educadora Janayna Costa – RECID PA, foi iluminado pela mística com musicas e poesia, fomentou o debate e para isso usou a dinâmica do carrossel no sentido de que as pessoas refletissem a partir do que entendem por conselhos e sua importância – dialogando com o cotidiano dos participantes, olhando para os desafios que devem ser enfrentados pelos conselhos na região da Transamazônica, mas inquietando-os quanto o papel que os conselhos têm para contribuir com mudanças na região. Reforçou, destacou a educação popular como pedagogia, como caminho necessário, a qual os conselheiros devem se apropriar para que outra cultura política possa ser fomentada na região, urgente e necessária.

A dinâmica do carrossel possibilitou a reflexão e desta os participantes afirmaram o seguinte:

Quando queremos fazer parte de uma denominada organização social, somos perguntados, o que se ganha com isso? Somos responsáveis pelo bem e mal da sociedade. Produzir a educação básica que é desenvolvida no dia a dia é dar sustentabilidade a luta social. Ser conselheiro exige formação continuada. O conselho de uma escola não é só para pegar dinheiro, mas também para resolver os problemas.

Ganhamos experiência ao fazermos parte de um conselho. Ganhamos mais do que recebemos quando participamos. Precisamos participar mais dos conselhos, isso também deve perpassar pela instância da escola. As decisões devem ser tomadas em equipe. Os conselhos são espaços importantes para fiscalizar e fazer acontecer mudança. O que dificulta participação, é não termos pessoas disponíveis, temos medo de falar, de denunciar.

Nossos desafios estão mais no medo de fazer denúncias, pois ou perdemos a vida, ou perdemos o emprego. Por isso, precisamos ter coragem em denunciar os erros, sermos comprometidos com a ética. Este desafio também perpassa pela falta de recursos para se fazer o trabalho. A formação sobre a atuação deste conselheiro também é um desafio.

Como sociedade civil, é preciso que se entenda que não existe mudança a toque de mágica. Os conselhos s

ão espaços de fundamental importância para fortalecer a democracia no país, para ajudar a mudar o país. Precisamos mudar diante do processo democrático, mudar a gestão, denunciar, mesmo com ameaças de desemprego , medo da perseguição. Os desafios precisam ser enfrentados.

Na escola os diretores têm medo dos conselhos – o compromisso que cada conselheiro deve ter. O errado é para ser denunciado. Não podemos ser omissos, participar de um conselho exige postura ética, comprometimento, exige disponibilidade do conselheiro. Os conselheiros/as precisam de preparação, e assim fazerem valer o seu papel. Temos que buscar parceria para nos fortalecer enquanto conselheiros ativos.

O processo democrático exige participação do povo. A democracia no Brasil exigiu muito do povo, vidas foram ceifadas. A participação é importante na construção de políticas públicas. A democracia não é a vontade de todos, mas hoje precisamos fazer com que passe a ser a vontade de todos.

Inquietações: Não podemos deixar de fazer valer nossos direitos, é preciso entender e saber onde estão localizados, os avanços que demos no campo das políticas públicas por conta de nossos gritos, de nossas reivindicações, assim fomos conquistando espaços, temos que acabar com as sequências de exploração na Amazônia.

 

AVALIAÇAO:

O momento de partilha do conhecimento e de inquietação, de estudo. Momento de riqueza para nossa formação. Precisamos de mais momentos como este. Passamos o ano todo, sem momento de formação, de parada para estudar, crescer, partilhar nossas experiências e sofrimentos.

Queremos que o sindicato possibilite mais momentos como este, pois assim, podemos olhar para nós mesmos, rever nossos compromissos e assumir mudanças a partir de nós mesmos

Concluímos que nessas idas e vindas, temos tantas belezas a serem “descobertas”, que as histórias contadas pelos desbravadores, homens e mulheres, foram persistentes, desafiaram a vida, lutaram, enfrentaram os desafios que a longa estrada foi apresentando. Confiaram na sorte, em Deus, nos seus sonhos e na vontade de construir nesse pedaço da Amazônia o lugar para morar, povoar, desenvolver, lutar, enfrentar a vida, gerar vidas.

Seu Catarino Muller, afirma “’os momentos foram difíceis, mas vencemos, agora, esperamos que o estado de Tapajós traga para nós novas perspectivas, merecemos uma vida melhor”.

 

Altamira, 28 de novembro de 2011

 

Vera Lucia Lourido Barreto

Assessora da Secretaria Nacional de Articulação Social

Depto de Educação Popular e Mobilização Social.

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